Em frente, vamos!.

EM FRENTE, VAMOS! Com presença, serenidade e persistência, há boas razões para esperar que isto é um bem...

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quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Reis na República


Recorremos a um título antagónico mas sugestivo dada a intenção objetiva: trazer à colação o debate acerca da educação das crianças; das crianças de tenra idade! Estas – aqueles pequenitates - são a geração tecnológica, a “geração-indivíduo”, a geração “Rei” do espaço, do tempo, da condução das circunstâncias, das estâncias e das instâncias!
O Debate Nacional sobre a Educação suscitou a abordagem - entre outras matérias relevantes para a educação que, aparentemente, “ganham bolor” no fundo das gavetas. Destacamos o Estudo “A Educação das Crianças dos 0 aos 12 Anos” para o Conselho Nacional da Educação, coordenado pela Profª Isabel Alarcão.
Há muito que seguimos com particular interesse o debate. Preocupa-nos a passagem à ação, isto é, a inação!
Entretanto, o mundo avança – já avançou! O que há seis anos seria o início do debate hoje é uma realidade incontornável. Nas escolas estão crianças donos do mundo. São monarcas, oligarcas, ditadores. São autónomos na sua “razão” – ainda bem! Porém, o que podemos fazer para vivermos juntos?
Naquele tempo, apontavam-se “reflexos de uma série de factores sociais como o desemprego, os baixos níveis de escolarização dos pais, a maior taxa de mulheres trabalhadoras a tempo inteiro na Europa, factores que, aliados à crescente multiculturalidade, às transmutações da família tradicional com muitas situações de famílias mono-parentais e de crianças sem pais, tornam os contextos educativos muito vulneráveis. Mudanças de comportamentos com tendência para o sedentarismo e a passividade perante a televisão ou o fascínio do entretenimento com jogos informáticos levaram à reorganização dos espaços, dos tempos e das vivências da infância e a um novo relacionamento com o mundo, provocando um modo diferente de apreender e conviver com o real. Vivências em culturas multireferenciais, disparidade de informações e diversidade de solicitações transformaram a criança num consumidor precoce, alvo de processos de marketing desenfreado”. (Alarcão, 2008. 22-23).
No que conhecemos, junto das crianças que entram na idade da razão, não lugar para mais ninguém nem para mais nada. Apenas elas. A ditadura é uma coisa séria!
(in Correio do Vouga, 2013.10.30)





terça-feira, 15 de outubro de 2013

Uma vida que se lê


D. António Marcelino é um itinerário de leitura permanente.
Depois de uma vida intensa e atenta, partiu. Confia-nos um vasto património espiritual, intelectual, pastoral, social,… esteve onde foi preciso e foi além de sim mesmo para quebrar inércias, marasmo, lentidão.
Ficam as primeiras fontes de evidência de uma vida enorme nas páginas do Correio do Vouga, nas edições de “Pedaços de vida que geram vida”, na copilação “A vida também se lê”.
“Há acontecimentos e situações que vivemos, mas não nos pertencem só a nós. Há vidas destinadas a ser berço de acolhimento de graças para as repartir pelos outros.
Para este livro, escolhi vivências provocadas por gente que passou pela minha vida ou dela fez parte. Por vezes, gente simples e anónima, aquela que julgamos que nada tem para nos dar ou ensinar… Gente experiente de Deus com a qual me foi dado cruzar, nos caminhos da missão, e já neste longo tempo do meu peregrinar» destaca o Sr D. António Marcelino nesta nota-síntese para Pedaços de vida que geram vida.
Valorizava tudo o que era seguir em frente; destacava, enfatizava, discutia, dava melhor sugestão, envolvia-se e envolvia. Ao ponto de, pela força de convocar todos para ir mais longe, assumir “não morro nem que me matem”!
O respeito pelo Ministério e pelo Múnus impõem decoro, reverência nas referências connosco. Porém, não fossem esses imperativos, dir-se-ia que D. António Marcelino era uma pedrada no charco (evocando o título do registo com que denunciava as injustiças encontradas), uma força da natureza! Profundo em tudo, até nas coisas simples.
Ler a vida de D. António Marcelino, na profundidade de uma vida doada aos outros, à Igreja, é encontrar sementes do Verbo disseminadas por ele em nós, é reler o nº 33 da Lumen Fidei: no diálogo entre a fé e a razão, em D. António Marcelino, também Bispo para nós, como Santo Agostinho, encontramos um exemplo significativo deste caminho: a busca da razão, com o seu desejo de verdade e clareza, aparece integrada no horizonte da fé, do qual recebeu uma nova compreensão. Acolhe a filosofia grega da luz com a sua insistência na visão: o seu encontro com o neoplatonismo fez-lhe conhecer o paradigma da luz, que desce do alto para iluminar as coisas, tornando-se assim um símbolo de Deus. Desta maneira, Santo Agostinho compreendeu a transcendência divina e descobriu que todas as coisas possuem em si uma transparência, isto é, que podiam refletir a bondade de Deus, o Bem.




terça-feira, 8 de outubro de 2013

O fim deste Estado

 

As contas públicas, as políticas do Governo para as tratar e, a montante desse exercício contabilístico, a espiral de pobreza em que são colocados os portugueses... é aterrador. Um apelo à insurreição. Tudo isto aponta para um cenário “tuberculoso” , que nem o Príncipe de Maquiavel seria capaz de ousar: “todo o Príncipe inteligente deve fazer: não somente vigiar e ter cuidado com as desordens presentes, como também com as futuras, evitando-as com toda a cautela porque, previstas a tempo, facilmente lhes pode opor corretivo; mas, esperando que se avizinhem, o remédio não chega a tempo, e o mal já então se tornou incurável. Ocorre aqui como no caso do tuberculoso, segundo os médicos: no princípio é fácil a cura e difícil o diagnóstico, mas com o decorrer do tempo, se a enfermidade não foi conhecida nem tratada, torna-se fácil o diagnóstico e difícil a cura”.

É inacreditável!

Não há uma medida propalada, para o Orçamento do Estado, que seja equitativamente transversal. Só se verifica o linear, o corte horizontal, entre os que têm pouco ou nada. Agora, mais cortes nos serviços que garantem alguma qualidade de vida (educação e saúde), cortes nos salários e pensões; elaboração do plano tíbio de incapacitar, pela diminuição da possibilidade do acesso, os serviços passam a ser menos utilizados; como não são utilizados, pode-se fechar!

Quebrou-se o princípio basilar das organizações: a confiança.

A confiança formal, aquela que precisa ser vinculada contratualmente, é imprescindível. Mas com recurso a instrumentos vinculativos não deixa de ser um ato de apreciável valor o respeito recíproco pelos termos que se firmaram. Com as medidas aplicadas, esta dimensão deixou de fazer qualquer sentido. Se o Estado não cumpre os contratos, altera-os, rompe-os como é que as pessoas podem manter a coesão social?!

A confiança informal, a gerada no caráter dos interlocutores, também já não existe…

E a confiança como elã para o futuro, geradora de esperança?! Está devastada. Este país é mesmo para velhos, apreciados Ethan Coen e Joel Coen!

Nada! Quem lança o olhar em frente tem de focar muito para ver algo de bom no horizonte. Um horizonte perdido, com uma única ideia: estes pobres são muito ricos! Portanto, forte com os fracos!

 

(in Correio do Vouga, 2013.10.09)

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Areópagos da vida comum

 

Terminada uma etapa determinante da vida coletiva, as eleições autárquicas, os resultados sugerem-nos três eixos de ilação.

O debate.

Há uma tentativa de manietar o poder político e os seus representantes. E também há um interesse dos representantes, a troco de notoriedade, de enveredarem por trajetos demagógicos, ilusórios, descredibilizantes do caráter e dos projetos. A procura da mensagem subliminar provoca a deturpação do essencial e a mensagem deixou de ser a arte do conteúdo. “O meio é a mensagem”! Triunfaram os meios, não só meio - Marshall McLuhan, na sua obra Os Meios de Comunicação como Extensão do Homem, preocupou-se em mostrar que o meio é um elemento importante da comunicação e não somente um canal de passagem ou um veículo de transmissão.

Os meios, bons ou maus, escondem o conteúdo, declinam-no para segundo plano; relevam-se areópagos e areopagitas dotados de uma retórica tendenciosa porque faz juízo próprio sobre matérias sem direito ao contraditório, o que confunde, distorce, provoca insídias.

"Areópago" é a adaptação de areopagus (ou Areios Pagos, de "Ἄρειος πάγος"), que significa algo como "Colina de Ares", em referência ao deus da guerra grego. Tal referência deve-se ao fato de os membros do Areópago, por serem aristocratas, cumprirem em geral a função de guerreiros de elite em tempos bélicos, responsáveis pela proteção da cidade. Normalmente funcionavam como Tribunal supremo de Atenas, composto de 31 membros, antigos arcontes, e encarregado do julgamento das questões criminais mais graves. Alcançou reputação de equidade e sabedoria e, por isso, areópago passou a significar, figuradamente, assembleia ou corte de justiça augusta, imparcial e soberana.

A distância.

As pessoas estão, muito pela consequência dos efeitos dos meios que são mensagem, longe de tudo. Particularmente longe dos que se candidatam honestamente à representação das próprias no governo da “cidade”! Não há interesse sobre os programas de governo, sobre os protagonistas. Aos candidatos, a todos os candidatos e parte dos candidatos entre si, mormente os que menos ideias têm sobre o fundamental, colou-se o rótulo de sinuoso, ardiloso, etc. – com conotações não transmissíveis em espaço público. “São todos iguais” – não haveria nenhum problema se isto não quisesse dizer o pior do ser humano.

A fase do imaterial.

A vida das pessoas vai entrar no momento de viver mais com menos. A fase das engenharias, das construções, terminou. Terminou por não haver fundos e por não haver fundos para mais. Agora o essencial está no “pão de cada dia”, na edificação da pessoa como cidadão comprometido e responsável pelo seu futuro. Os próximos tempos são os da maturidade social: mais conhecimento, mais cultura, melhor investimento, seriedade, responsabilização.

O futuro só é possível sem demagogia e interesses primários!

 

(in Correio do Vouga, 2013.10.02)