Em frente, vamos!.

EM FRENTE, VAMOS! Com presença, serenidade e persistência, há boas razões para esperar que isto é um bem...

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quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Natal em 2015



Tempo de encontro, de memória, tradição, Fé!
Tempo de paz!?



No respeito pelas diferenças, tempo de renovação de compromissos: temos de fazer mais!
Feliz Natal, amig@s.

LITANIA DO NATAL





A noite fora longa, escura, fria.
Ai noites de Natal que dáveis luz,
Que sombra dessa luz nos alumia?
Vim a mim dum mau sono, e disse: «Meu Jesus…»
Sem bem saber, sequer, porque o dizia.

E o Anjo do Senhor: «Ave, Maria!»

Na cama em que jazia,
De joelhos me pus
E as mãos erguia.
Comigo repetia: «Meu Jesus…»
Que então me recordei do santo dia.

E o Anjo do Senhor: «Ave, Maria!»

Ai dias de Natal a transbordar de luz,
Onde a vossa alegria?
Todo o dia eu gemia: «Meu Jesus…»
E a tarde descaiu, lenta e sombria.

E o Anjo do Senhor: «Ave, Maria!»

De novo a noite, longa, escura, fria,
Sobre a terra caiu, como um capuz
Que a engolia.
Deitando-me de novo, eu disse: «Meu Jesus…»

E assim, mais uma vez, Jesus nascia.

José Régio

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Por fim… o Pátio dos Gentios




 
O mês de dezembro não é a possibilidade de preparação imediata para uma “data qualquer” – poderia ser este o princípio de um texto politicamente correto. Não pode ser. Não pode ser nem político nem correto! Porque o que está em causa é a celebração do Natal, a Incarnação de Deus para resgatar o homem do pecado (do original e de todos os outros pouco originais; e são muitos)!
Como se sabe a expressão “politicamente correto” emerge na segunda metade do século XX, nos Estados Unidos, durante as disputas culturais. Servia para camuflar extensivamente a referências de classe, raça, género, orientação sexual, nacionalidade, incapacidade e outras designações para subentender a subalternidade. Enquanto, por exemplo, os negros autodescreviam-se como “afro-americanos” — valorizando a lógica da identidade pela cultura de origem, e não pela cor da pele —, os simpósios “Correção Política e Estudos Culturais” propunham examinar qual o efeito que tem sobre a pesquisa académica a pressão para se conformar a ideias atualmente na moda. Tomava corpo a bem sucedida estratégia de certos setores nas guerras culturais: a “pressão” para que se adotassem expressões “politicamente corretas” para silenciar o outro enquanto se faz de vítima oprimida.
Não querer usar o politicamente correto é exatamente para podermos olhar os sinais emergentes como contrários a tudo o que o Natal trouxe ao mundo, partindo da mensagem de amor universal para os homens e mulheres de boa vontade.
Mas a boa vontade tem limites!
Com o Natal e o fim do ano, no Calendário Gregoriano, é certo que há aumentos no preço das coisas que os cidadãos mais necessitam, quer expressamente (para procura do salário justo e vida digna, transportes por exemplo) e ocultamente (dependências energéticas, comunicações,… as armadilhas do sistema)!
E como se não bastasse… mais um Banco!
Como se pode ser politicamente correto com isto?!
Os aumentos (em nome de quê? Porque razão para além da “abutrização” - de abutres! - dos “Mercados”?) e a falta de verdade (no caso do tratamento dado às coisas do Estado, Banif por exemplo) promovem a desintegração social, sustentam dependências, escravizam as pessoas!
O espírito de Natal (tolerância e tréguas) dará, por fim, lugar à expulsão dos vendilhões no Pátio dos Gentios!
Naquele tempo havia homens ricos e pobres, virtuosos e criminosos, livres e escravos. O Templo, em Jerusalém, constituía-se num lugar de peregrinação, era um lugar visitado por pessoas e comunidades de todas as nações. Tinha quatro pátios. O primeiro era o “pátio dos gentios” (“hieron”, ocupado pelos mercadores que realizavam trocas de dinheiro e vendiam os animais. Transformaram aquele espaço em "casa de comércio", em "casa de privilégios”, em que os movimentos comerciais relacionados e bastante lucrativos  eram monopolizados apenas por algumas famílias! O resto da história é sobejamente conhecida,… o Nazareno, o mesmo da ternura do Natal, deu cabo daquilo tudo!
Por fim,… basta!

(in Correio do Vouga, 2015.12.22)

domingo, 6 de dezembro de 2015

O “perigo” desta Misericórdia

 

A explicitação com recurso ao demonstrativo (d´esta) ganhou atualidade, a propósito da economia reinante, na “Evangelii Gaudium".

Pois na abertura do Ano da Misericórdia acentua-se o apelo à mudança profunda na interpretação das ações consagradas em doutrina: “poderemos fazer a experiência de abrir o coração àqueles que vivem nas mais variadas periferias existenciais, que muitas vezes o mundo contemporâneo cria de forma dramática. Quantas situações de precariedade e sofrimento presentes no mundo actual! Quantas feridas gravadas na carne de muitos que já não têm voz, porque o seu grito foi esmorecendo e se apagou por causa da indiferença dos povos ricos. Neste Jubileu, a Igreja sentir-se-á chamada ainda mais a cuidar destas feridas, aliviá-las com o óleo da consolação, enfaixá-las com a misericórdia e tratá-las com a solidariedade e a atenção devidas. Não nos deixemos cair na indiferença que humilha, na habituação que anestesia o espírito e impede de descobrir a novidade, no cinismo que destrói. Abramos os nossos olhos para ver as misérias do mundo, as feridas de tantos irmãos e irmãs privados da própria dignidade e sintamo-nos desafiados a escutar o seu grito de ajuda. As nossas mãos apertem as suas mãos e estreitemo-los a nós para que sintam o calor da nossa presença, da amizade e da fraternidade. Que o seu grito se torne o nosso e, juntos, possamos romper a barreira de indiferença que frequentemente reina soberana para esconder a hipocrisia e o egoísmo” - da Bula convocatória, nº 15.

Isto é perigoso. Este homem é perigoso! Vai ao encontro dos que precisam, sai do que poderia ser considerado “zona do conforto” (segurança, poder, esquemas mentais, dinâmicas de rotina, “status” social, delimitação conceptual, saudosismos inveterados de monopólios,…)! É um perigo, pelo que faz e como o faz, para ele e para os outros. Quem concorda mobiliza-se, quem não concorda sente-se desmobilizado. E há uns tantos que se deixam consumir (enquanto podem) pelo sentimento perdido “assim não vamos lá” – são aqueles, quais náufragos, que se agarram a umas pequenas tábuas que flutuam à sua volta na convicção que excluindo estão a agir como certo (no fundo não mais do que medo do seu próprio futuro: afundarem-se).

O perigo ganha expressões que parecem ainda mais acentuadas com comparações que andam por aí em “remember” assustador. Escrevia no Público Alexandra Lucas Coelho “O PREC (processo revolucionário em curso) do Papa em 2015”: O que aconteceu na República Centro-Africana, segunda-feira, foi que o Papa Francisco atravessou um cerco de milícias cristãs armadas para ir ter com os muçulmanos enclausurados lá dentro. A capital do país é Bangui, o cerco acontece num bairro chamado PK5, que se tornou o reduto dos últimos muçulmanos, depois de as milícias cristãs terem forçado mais de 100 mil a fugir, entre vários massacres. A violência dessas milícias é uma resposta à violência da coligação de rebeldes muçulmanos que governou o país durante uns meses de 2013. Foi este ciclo de violência que Francisco procurou quebrar, transpondo o cerco de pé num carro descoberto. E chegando à mesquita central disse “Deus é paz, salam”, “somos irmãos e irmãs”. O PÚBLICO citou o que um velho muçulmano, Idi Bohari, disse à Agência France Press: “Pensávamos que todo o mundo nos tinha abandonado, mas ele não nos abandonou. Ele também nos ama, aos muçulmanos, e eu estou muito feliz.”

Isto está mesmo estranho: estar fora do “direitinho” é um perigo revolucionário!

(in Correio do Vouga, 2015.12.08)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A restauração

 

Passou mais um “Primeiro de Dezembro”: restauração da independência (perdida para Espanha).

A morte de D. Sebastião, em Alcácer Quibir, sem deixar descendência, concorreu para a perda da Independência de Portugal. Sem um sucessor direto, a coroa passou para Filipe II de Espanha. Este, aquando da tomada de posse, nas cortes de Leiria, em 1580, prometeu zelar pelos interesses do País, respeitando as leis, os usos e os costumes nacionais. Com o passar do tempo, essas promessas foram desrespeitadas, os cidadãos nacionais foram perdendo privilégios e passaram a uma situação de subalternidade em relação a Espanha. A situação levou à organização de um movimento conspirador para a recuperação da independência, onde estão presentes elementos do clero e da nobreza. A 1 de Dezembro de 1640, um grupo de 40 fidalgos introduz-se no Paço da Ribeira, onde reside a Duquesa de Mântua, representante da coroa espanhola, mata o seu secretário Miguel de Vasconcelos e vem à janela proclamar D. João, Duque de Bragança, rei de Portugal. Terminavam, assim, 60 anos de domínio espanhol sobre Portugal. A revolução de Lisboa foi recebida com júbilo em todo o País. Restava, agora, defender as fronteiras de Portugal de uma provável retaliação espanhola.

Esta nota-síntese de (mais) um momento marcante da nossa história conduz-nos ao pensamento sobre outros movimentos de restauração – pensar crítico e com alguma bonomia sobre assuntos concordantes e discordantes.

A luta travada para que a Ocidental Praia Lusitana continuasse a evoluir de cabeça erguida (ainda falta resolver Olivença!) e a discussão sobre se valeu a pena parecem de somenos importância quando o dia “1 de dezembro” ficou reduzido a uma espécie de “Black Friday” português – com o início de dezembro surgiam as compras de Natal em massa, eram oficiosamente inauguradas as Festas! E a vertente comercial trazia o povo para a rua e, com ele, também a (outra) restauração beneficiava – este uso terminológico provem do francês restaurant, que terá surgido no século XVI, com o significado de "comida restauradora", querendo designar especificamente uma sopa. O uso moderno da palavra surgiu por volta de 1765 quando em Paris abriu um estabelecimento para servir comida, em oposição/complemento ao único local (para além das pousadas e tavernas) onde se podia adquirir comida pronta para consumo para além da cozinha de rua – também em processo de restauração no século XXI (“street food”).

A Restauração vai ser restaurada (com reposição de feriado, com redução da taxa do IVA,…) e, deseja-se, que mesmo uma República não esqueça a história que a precede em sistema de Estado e a projeta em comunidade (de diversidades, de minorias e maiorias em igualdade de oportunidades, em tratamento justo em ordem ao bem comum e não apenas ao serviço de algumas opiniões ou tendências para parecer “cool” ou “fashion”).

Vamos lá restaurar, Portugal! – com ou sem vírgula?

(in Correio do Vouga, 2015.12.02)

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Ouvir com outros olhos

 

Há dias um grupo de amigos, no propósito de registar uma etapa que vencemos juntos, assinalou o momento com o bom gosto da coletânea de dezasseis ensaios de João Lobo Antunes com este título bem sugestivo: ouvir com outros olhos!

E a ouvir, então, com esses outros olhos fazemo-lo em agradecimento aos amigos que também colaboraram, e diretamente, com este apontamento (Ponta de Lança) nas ideias, leitura da realidade presente nos últimos quatro anos, visão profunda de construir a sociedade em ordem ao bem comum!

O autor é sobejamente conhecido. Desde que foi jubilado do Hospital de Santa Maria, há cerca de um ano e, segundo palavras suas, “quando cheguei aos 70 anos, perguntei a mim próprio o que iria fazer, agora que não tinha de ir todas as manhãs para o Hospital de Santa Maria” - disse-o ao Jornal de Letras - , “decidi que ia entreter-me com a minha inteligência. Dito assim, isto pode parecer um pouco pretensioso, mas pensei que iria ser como um mineiro a escavar recordações.”

Entre as “escavações” feitas estão os percursos, às vezes difíceis de entender, no ziguezaguear da vida política e da cidadania, como aconteceu quando apoiou, em 2005, a primeira candidatura de Cavaco Silva à Presidência da República, cinco anos depois de ser mandatário de Jorge Sampaio (e por lá ficou repetindo-o cinco anos depois).

Por fim, ouvimos J. Lobo Antunes no ensaio “Um neurocirurgião na Casa da Música”, para podermos olhar bem longe e descodificar os mistérios da mente humana, numa altura em que o país está no ocaso de mais um mandato da Presidência da República que termina em debate aberto sobre as competências e limites das mesmas no exercício da soberania própria: “consequência desejável de qualquer processo de aprendizagem é, evidentemente, a maturação como executante, qualquer que seja o ofício. O grande Bruno Walter, discípulo de Mahler, dizia que havia três fases na vida de um maestro: na primeira tudo parecia simples e natural; depois seguia-se um período de insegurança e incerteza, e finalmente o da maturidade plena. (…) Na primeira fase, a da aprendizagem das coisas miúdas do ofício, o medo era a força educativa dominante; (…) cresceu a seguir a segurança, que foi tornada robusta pela familiaridade progressiva com os instrumentos que uso e por uma intimidade cúmplice com os tecidos em que laboro: matizes de cor, de textura, de resiliência, a distinção fina entre o normal e anormal. (…) Em relação aos instrumentos, a maturidade plena atinge-se quando eles perdem a sua individualidade e se tornam um mero prolongamento natural de nós próprios. (…) Note-se que, ao observar um músico ou um cirurgião que atingiram este patamar, dá por vezes a sensação ao espectador de uma enorme (mas enganadora) facilidade – “eu também sou capaz de o fazer”! Então, a aprendizagem está finalmente concluída.”

Nem mais! Porém, ficam dúvidas em relação a outros ofícios e oficiantes. Será sinal que a aprendizagem ainda não está concluída? É que nem o Conselho de Estado é ouvido… com outros olhos!?

(in Correio do Vouga, 2015.11.16)


quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Paris

 

Conhecendo a natureza humana, pouco ou nada nos surpreende nos acontecimentos de Paris da nefasta noite do recente treze de novembro. Nada surpreendidos com a natureza humana, portanto.

Não perfilamos a sustentação da ideia de que se trata exclusivamente de causas religiosas – pelo menos como o fenómeno religioso é entendido entre quem o estuda e vive!

A tensão entre os humanos é latente na oposição axiológica entre o diabólico (destes atos tresloucados que apenas se sustentam a si mesmos no impacto dispersivo do que os rodeia, dos outros) e o simbólico (quem procura reunir a diversidade em ordem ao bem comum, à harmonia das culturas e civilizações). Foi assim em Paris como continua a ser pelo mundo crispado nas milhentas oposições brutas, brutais, armadas, o mais básico instrumento para argumentar perante o que não convém ou se entende de outro modo!

Abordar o que é conhecido e está no topo da agenda mediática comprometeu-nos na releitura da compreensão dos atos, isto é, ao Tratado de História das Religiões (Mircea Elíade) comungando da opinião que as ciências modernas reabilitaram um princípio que certas confusões do século XIX comprometeram gravemente: é a escala que cria o fenómeno. Um fenómeno religioso somente se revelará como tal com a condição de ser apreendido à escala religiosa. Querer delimitar este fenómeno pela fisiologia, pela psicologia, pela sociologia, pelas ciências económicas e políticas, pela linguística e pela arte, etc. é traí-lo, é deixar escapar precisamente aquilo que nele existe de único e de irredutível, ou seja, o seu caráter sagrado. Porém, no mundo ocidental de dicotomias entre posição e oposição, sagrado é aquilo que se opõe ao profano.

A realidade não é definível em dicotomias. Até porque nós ocidentais temos a tendência para ver um dos lados da dicotomia como positivo e o outro negativo. Se, em ativo-passivo, o ativo é positivo, o passivo será negativo. É por esta razão que o pensamento oriental é por vezes difícil de seguir: o Yin e o Yiang, sendo pares, não são vistos como positivo e negativo, como uma parte a manter e outra a desaparecer, mas como complementos essenciais ao equilíbrio. O próprio positivo é negativo se não estiver equilibrado!

Nesta matéria, com tanta dispersão (diabólica), o equilíbrio só será concreto se chegarmos ao ponto de aceitar que a vida devia ser sagrada!

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Isolados por todos os lados

  M Oliveira de Sousa

Há bem perto de nós, no nosso concelho, ausência de meios para sair à procura de recursos elementares para o desenvolvimento! Coisas simples, sem custos para o erário público, são estagnadas por incúria, falta de visão ou, desejamos que não, deliberadamente. Estão nesta lista (de coisas simples), sendo bastante plebaico, a realidade plasmada num horário de serviços – sim, o papel ou suporte digital onde está publicitado um determinado, qualquer que seja, horário!

A funcionalidade (um serviço intermodal, por exemplo; um blogue!) e a conceção intuitiva de leitura são determinantes para se perceber o que existe e onde as pessoas podem obter o serviço (mínimo) que procuram: transportes, serviços de saúde, serviços judiciais,… Por enquanto, nota-se confuso, difuso, disperso, ausente!

Estamos quase como alguns países, que face aos índices de desenvolvimento segundo modelos estereotipados, considerados pobres: vá para lá (paragem do autocarro, posto médico,…) e espere! O atendimento? Logo se vê!

Ora, isto é o cúmulo do atraso. Pára tudo, por nada!

Há pouco tempo numa conferência sobre redes (falava-se de caminhos de ferro, mas os assuntos foram alargados para outras convencionais e digitais, mas sobretudo convencionais) discutia-se enfatizando consensualmente a existência e desempenho destas como principais infraestruturas para o desenvolvimento das pessoas, dos povos, das comunidades. É claro que o uso do termo redes, tão globalizado, quer significar as interligações que se encadeiam em imensas teias sucedâneas e dependentes.

Não se esgotou o assunto em exemplos porque os participantes partiam da mesma premissa: estar no mundo é estar ligado; o isolamento é a ausência de ligações. Há até expressões que são tautologias como, por exemplo, vias de comunicação (fluvial, rodoviárias, ferroviárias, aéreas,…)!

Protagonizam, desde logo os autores clássicos da Sociologia (Karl Marx, Max Weber, Émile Durkheim): o homem é um ser social. Somos sociais não apenas porque dependemos de outros para viver, mas porque os outros influenciam a maneira como convivemos connosco próprios, com aquilo que fazemos.

Se estivermos de acordo nisto, já demos passos enormes para sair do isolamento e dar consistência ao desenvolvimento da humanidade – aqui tão próxima!

Às vezes, havendo competência, basta que um pare um pouco (para pensar e (re)definir a visão das coisas) para que tudo funcione!


(in Correio do Vouga, 2015.11.11)


quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Justiça e Paz

 

 

Passaram dezassete anos, no dia 1 de novembro, desde que D. António Marcelino instituiu a Comissão Diocesana.

Num tempo em que pululam crispação e invertebralidade patrocinada por reflexão e agitação de algo próximo de “new age de Illuminati”, recordamos a visão do Bispo de Aveiro com saudosa memória.

Tanto feito não pode ser lavado nas primeiras águas de uma chuva miúda. E ao entrar na maior idade, faz-se notar que o horizonte de ontem ainda permanece bem aberto:

“A constituição da Comissão Diocesana Justiça e Paz é um projeto com muitos anos que só agora se concretiza. Foi, por fim, uma decisão do Sínodo Diocesano e não podíamos retardar mais a sua execução.

Surge em boa hora, quando se comemoram os cinquenta anos da Declaração Universal dos Direitos do Homem. Ela vai ter nesta Declaração um estímulo e uma inspiração.

A evolução da sociedade aveirense, com os normais problemas sociais e humanos, requer uma atenção especial por parte da Igreja Diocesana.

Temos a convicção de que o encontro da Igreja com a sociedade, com a cultura, com a tecnologia, com qualquer atividade humana organizada, se faz no homem ou na pessoa concreta. Respeitando sempre a autonomia das diversas instâncias sociais, sentimos o dever de estar presentes com aquilo que hoje nos é específico, onde se joga a vida das pessoas, onde se luta pela dignidade humana e pelos valores fundamentais.

A Comissão Diocesana Justiça e Paz, com as suas atribuições e composição pode e deve ser uma presença atenta, um espaço de reflexão séria, uma chamada de atenção oportuna, uma voz respeitosa de denúncia, sempre que estão em causa valores humanos e sociais a apoiar, a estimular, a defender e iniciativas a propor e a acompanhar.

Ao apresentar a Comissão quero sublinhar dois aspetos importantes: a sua dimensão eclesial, pela estreita ligação ao Bispo da Diocese e à sua missão pastoral, e a sua estrutura laical, pela sua presidência, composição e campo de atuação. Dois aspetos complementares que a enriquecem e valorizam a sua ação, tendo em vista a fidelidade que norteia e a autonomia de que dispõe.

Aprovo os Estatutos da Comissão Diocesana Justiça e Paz, elaborados por um grupo que fez uma longa caminhada de reflexão, e quero deixar, desde já, uma palavra de estímulo e gratidão a todos quantos a venham a constituir, fazendo dela um meio útil à missão da Igreja, no seu serviço às pessoas e à comunidade humana aveirense.”

(in Correio do Vouga, 2015.11.04)

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

O Governo das coisas

 

As instituições de apoio e caridade social – não são necessários pruridos semânticos sobre o que vale mais entre caridade e solidariedade, trataremos disso no próximo Correio do Vouga - têm registado um aumento significativo do número de pedidos de apoio por parte das famílias portuguesas – referíamos no anterior número do Correio do Vouga.

Os termos têm origens diferentes, originalidades próprias, processos de atuação diferenciados e fins próximos.

À atitude de amor (“caritas, caridade”) ao que está ao lado e que precisa (o amor do próximo – no Evangelho (Lucas 10) a questão colocada sobre “quem é o próximo?” dá a entender como certa a resposta sobre o que atua “com-paixão”, independente da proveniência étnica, ministério, responsabilidade, grandeza ou simplicidade) emergirá o ser solidário (deriva do latim «solidu», que significa firme, consistente, seguro, duradouro, mas também aquele que tem responsabilidade mútua ou interesse comum, que apoia, que está pronto a auxiliar ou a defender outrem, que tem as suas funções em estreita correlação com outros órgãos).

A discussão e legitimação da natureza e origem do poder com a sociabilidade a inscrever-se num quadro de virtudes sociais, promoveu como finalidade política os fundamentos da sociedade, da natureza humana e da ideia de humanidade, procurando redescobrir as regras do direito natural a partir dos princípios fundamentais da natureza humana, traçadas por Smith e por Rousseau que circunscrevem, duas perspetivas de compaixão: Smith refere que o homem é portador de dois princípios, o amor de si e o interesse pelo outro, e Rousseau apresenta a compaixão como categoria política, dois princípios primordiais decorrem do direito natural; o cuidado de si e a compaixão (decorrente dos direitos naturais e dos deveres para com o outro).

Incorporando uma determinada capacidade de sofrimento com e pelos outros, a compaixão virá historicamente a ser entendida como uma capacidade instrumental legitimadora das ações públicas, traduzindo virtudes republicanas como essência das virtudes políticas.

Os comportamentos de sociabilidade (interligados ao conceito de civilidade), desenvolvem-se a partir do século XVI e estão na origem de todas a interrogações da compaixão.

O projeto de educação moral e política nos séculos XVII e XVIII apoia-se nestes conceções. A compaixão constitui-se uma noção chave da civilização republicana, cuja natureza política assenta na igualdade-solidariedade.

Apreendida como ideologia nos finais do século XIX, a solidariedade implicou uma nova representação do vínculo social e político, provocando simultaneamente uma alteração nos modos e nas formas de gestão do social e de intervenção pública.

O surgimento da solidariedade como um discurso ritual ou ainda entrepondo-se na verificação e julgamento de valor, ciência e ideologia, práticas sociais e políticas públicas, consciência subjetiva e determinações objetivas, cujo domínio nos séculos XVIII e XIX no discurso político, contrapõe com o termo caridade, interpretado como uma fraqueza do Estado, de retorno do plano religioso. Enquanto a igreja trabalha intensamente no âmbito da “questão social”, surge uma nova geração de “liberais” decorrente da crise teológica e eclesiástica, que vão contribuir para uma nova “moral laica”. Contrariamente às conceções de caridade numa ótica filantrópica ou humanista, a solidariedade apresenta-se como um sentimento de compaixão, oscilando entre a simpatia reflexo de um subtil equilíbrio entre o eu e o outro e o amor ao próximo, fundamentos da solidariedade, as grandes leis da assistência do princípio do século XX, como referência incontornável na construção e conceptualização das políticas sociais, concebidas de uma forma extensiva na luta contra os dispositivos de exclusão social.

 

(Correio do Vouga, 2015.10.28)

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Pobreza, um bom negócio?

 

Porque passou esta semana o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

Celebrou-se a 17 de outubro. A data foi comemorada oficialmente pela primeira vez em 1992, com o objetivo de alertar a população para a necessidade de defender um direito básico do ser humano.

A erradicação da pobreza e da fome é um dos oito objetivos de desenvolvimento do milénio, definidos no ano de 2000 por 193 países membros das Nações Unidas e várias organizações internacionais.

A pobreza no mundo, segundo dados revelados pela UNESCO, aponta que 842 milhões de pessoas continuaram a sofrer de fome crónica entre 2011 e 2013.

Contudo, a pobreza está a diminuir a uma taxa sem precedentes. Em 1990, 43% da população mundial vivia em pobreza extrema, com menos de 1,25 dólares por dia. Este número reduziu para 21%, mas há ainda muito trabalho pela frente, especialmente no continente africano.

Por sua vez, em Portugal o número de pobres e de pessoas que passam fome tem vindo a aumentar, em resultado da crise.

Segundo dados revelados pela Rede Europeia Anti-Pobreza, 18% dos portugueses são pobres. De acordo com esta organização, o número europeu que serve de referência para definir a pobreza equivale a um vencimento mínimo mensal de 406 euros.

Portugal surge na 141ª posição do top dos países mais pobres do mundo, com um PIB (PPC) per capita de 23,185 dólares.

As instituições de apoio e caridade social – não são necessários pruridos semânticos o que vale mais entre caridade e solidariedade, trataremos disso no próximo Correio do Vouga - têm registado um aumento significativo do número de pedidos de apoio por parte das famílias portuguesas.

E voltando ao título, será um bom negócio?

A Fundação Lusitânia defende, tendo vindo a trabalhar nesse sentido, sob o princípio que a economia é uma ciência social, tendo havido uma evolução anormalmente do ponto de vista técnico e científico, mas com sérios retrocessos sociais e humanos. As pessoas são parte da solução para os problemas económicos e deveriam ter as ferramentas para serem autossuficientes. E propôs áreas (Zonas Especiais de Economia Social de Mercado) com autonomia fiscal, administrativa e jurídica, que garantam um ambiente seguro para o início de um processo produtivo sustentado, em que o ser humano seria o centro. No fundo, zonas protegidas, com uma cultura própria, onde as infraestruturas já existentes são aproveitadas, de forma a tornar os locais intervencionados autossuficientes e até exportadores de recursos, acabando com a subsidiodependência. Se sem crescimento económico não há progresso, uma ZEESM só é autossustentável se for rentável, criar riqueza é mais importante do que fazer dinheiro. A ideia de que todos os ricos são os responsáveis pela pobreza e que para combater a pobreza é preciso combater a riqueza é algo profundamente errado. As ZEESM propõem formas mais eficazes e mais rentáveis de continuar a criar riqueza, abrindo novos mercados, isto é, a partir do fator social, se combatermos a pobreza de forma adequada, vai-se criar mais riqueza. Portanto, um bom negócio.

Refletindo sobre a origem da expressão (negação do ócio), porque não?

(Correio do Vouga, 2015.10.21)

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Isto e o seu contrário

Ou a ousadia da multiplicidade

 

Não faltam, nem nunca faltaram, opostos, isto e o seu contrário! Entre outros títulos e momentos, recordamos “Cláudio e Constantino” com mais de um ano ao “Sol” – como descreveu Filipa Melo no periódico homónimo sobre o argumento do título de Luísa Costa Gomes: se existe o que existe, então terá de existir também o que não existe, caso contrário o que existe não existiria. Uma “novela rústica em paradoxos”, ou antes um romance delicioso a partir de confrontos filosóficos entre verdade e especulação, alguns velhinhos de há 25 séculos.

A dupla, do romance, claro, anda junta por aí como se não houvesse mais nada - acrescentamos!

No começo da história (ou logo depois do começo do começo), Constantino e o irmão mais novo, Cláudio, estiveram tão entretidos a dar banho aos pintos no celeiro do Mirandolino que se esqueceram da hora de regresso a casa – mito interessante! Agora, estão sozinhos no escuro, à procura do melhor caminho. O que fazer? “Encontrar um ponto de referência 'por exemplo'. Em vez de 'por acaso'“. Constantino, bem mais especulativo e teatral do que o irmão, pode não chegar a resolver as questões, mas nunca larga o leme das reticências e possibilidades. Sobressai a eficácia das situações e dos diálogos criados para ilustrar inúmeros paradoxos, dilemas ou falácias famosos, sempre com recurso ao registo paródico e humorístico e à intertextualidade. Na casa grande e abastada da família, cheia de afeto e de vida e de temperamentos e nomes curiosos, Cláudio e Constantino vivem ou sonham maravilhosas aventuras de dúvida e descoberta. Neste romance, cabe mesmo tudo, para todas as idades.

A sugestão de leitura referida é apenas um subsídio para a compreensão desta ”maçada” de haver outras possibilidades de vida, de ação, de saída para as coisas que nos atormentam, como, por exemplo, o governo de um país! É saudável a plêiade de paradoxos que sustentam os passos andados e o contrário nas costas de quem anda:

Estar vivo é fingir-se morto;

Agir é prepotência;

Falar é arrogância;

Tomar a iniciativa é soberba;

Reclamar é falta de educação;

Dialogar é não falar sozinho;

Esquerda é não direita;

Resolução é autoritarismo;

Democracia é não tirania;

Inação é falta de cidadania;…

Existir com os outros é não estar sozinho!

Atribui-se a Mário Bergoglio, de Buenos Aires, "uma pessoa aparecia a correr a pedir socorro. Quem o perseguia? Um assassino? Um ladrão? Não..., um medíocre com poder. É verdade: pobres dos que estão sob o domínio do medíocre. Quando um medíocre acredita e lhe dão um pouco de poder, pobres dos que estão sob a sua alçada. O meu pai dizia-me sempre: "Cumprimenta as pessoas quando fores subindo, porque irás encontrá-las quando vieres a descer. Não duvides".

(in Correio do Vouga, 2015.10.14)

terça-feira, 6 de outubro de 2015

E agora? Tem de ser…

 

Vemos o momento que o país vive sob o prisma da solidariedade, que M Oliveira de Sousaconsideramos de amor ao próximo sem rodeios ou estigmas religiosos, alicerçado nos valores que conduziram muitos a sucumbir na luta pela igualdade, liberdade, fraternidade.

Depois das comemorações do feriado – de latim “feria” - “5 de outubro”, destacamos quanto é importante que a organização (também sistema) democrática se faça ouvir na eloquência dos atos: exercícios de cidadania para o bem comum. Só assim faz sentido a existência de seres pensantes; de outros interessa preservá-los e não é necessário que seja por aglutinação.

Evocando o grupo “Deolinda”, na canção bem sugestiva, “que seja agora”! – também foi mote de uma campanha.

Que seja agora, então, que assomem respostas plurais aos anseios da maioria dos portugueses que votaram.

Respostas aos problemas do país, um Estado Democrático em República, como as que na esfera pública vão emergindo sustentadas em projetos inteligentes e de custos reduzidos:

O “nosso” – por amizade, colaboração e por ser de Aveiro – Prof José Carlos Mota, um dos coordenadores da Plataforma da Bicicleta e Mobilidade Suave, parceria da Universidade de Aveiro (UA) que envolve investigadores, empresas e outras entidades, foi distinguido com o Prémio Nacional “Mobilidade em Bicicleta” 2015, categoria “Cidadania”. – Já abordado pelo “Correio do Vouga” no último número.

Segundo dados do INE, a sub-região Baixo-Vouga é a região portuguesa onde mais pessoas andam regularmente de bicicleta - o valor é oito vezes superior à média nacional - e o concelho da Murtosa, com 17%, é aquele com mais utilizadores de bicicleta em termos relativos. Face a estes dados e ao crescente interesse e importância da bicicleta na região, a Universidade de Aveiro lançou a Plataforma Tecnológica da Bicicleta e Mobilidade Suave.

A plataforma procura ajudar e apoiar a investigação que tem vindo a ser desenvolvida e tirar partido das experiências e projetos na área. Tem, inicialmente, cerca de 15 a 20 investigadores com a missão de apoiar e criar condições favoráveis para o uso da bicicleta e promover modos de deslocação em mobilidade suave, na região de Aveiro e em Portugal, como forma de estimular a melhoria do ambiente, mobilidade ou mesmo da economia.

Salientamos também o Projeto “Re-food”. Um movimento comunitário independente, 100% voluntário, conduzido por cidadãos e integrado numa IPSS, cujo fim consiste na recuperação de comida em boas condições para alimentar pessoas necessitadas. A Re-food está totalmente voltada para a comunidade e opera a partir da própria comunidade, sem salários, com custos baixos e alta produtividade, não detendo bens ou investimentos que não sirvam a sua missão.

Tem por missão eliminar o desperdício alimentar e acabar com a fome, incluindo neste esforço todos os membros da comunidade.

Todos têm a comida que precisam, todos os alimentos são aproveitados, todos os cidadãos participam ativamente na gestão dos preciosos recursos comunitários e todos assumem o seu poder, o seu direito e a sua obrigação de transformar o mundo num lugar melhor.

“Tem de acontecer, porque tem de ser, e o que tem de ser tem muita força. E sei que vai ser, porque tem de ser. Se é pra acontecer, pois que seja agora.”

(Correio do Vouga, 2015.10.07)

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Medo

 

Multiplicam-se os sintomas pelo mundo. E mais próximo de nós a situação não está melhor.

Voltamos às pessoas que chegam à Europa sem nada e querendo apenas viver!

Perante esta mole humana os sinais emitidos pelos governos do “Velho Continente” continuam desconcertantes. Chegamos ao ponto de não saber intitular o fenómeno para não perder a face no monólogo discursivo institucional – íamos a dizer “diálogo”, mas parecia um eufemismo! - Serão “refugiados” (de guerra)? Sem terra? Sem teto?... sem nada? Serão “imigrantes”? Nem há um risco de designar qualitativamente o que são estes grupos (de PESSOAS! – arriscamos nós).

O medo é uma teia muito urdida.

Procurámos pensamentos (na forma panfletária “em linha”, na internet) sobre o assunto:

“O medo é a qualidade de quem não tira as teias de aranha do teto, temendo que o teto caia” (John Garland Pollard); "O maior erro que se pode cometer na vida é o medo constante de cometer erros" (Elbert Hubbard); “O medo é o pior dos conselheiros” (Alexandre Herculano); “O medo nasce da ignorância” (Victor Hugo); “Eu aprendi que a coragem não é a ausência de medo, mas o triunfo sobre ele. O homem corajoso não é aquele que não sente medo, mas aquele que conquista acima do próprio medo” (Nelson Mandela); “As nossas dúvidas são traidoras e fazem-nos perder o bem que poderíamos ganhar não tendo medo de tentar“ (W. Shakespeare); “O medo é a pior das doenças: paralisa o corpo e a mente” (desconhecido); “Quando se perde o medo é quando mais se ganha” (M. Gandhi); “O pior medo é o medo de nós próprios (José Luís Peixoto); “A essência da felicidade é não ter medo” (F. Nietzsche); "A coragem que vence o medo tem mais elementos de grandeza que aquela que o não tem. Uma começa interiormente; outra é puramente exterior. A última faz frente ao perigo; a primeira faz frente, antes de tudo, ao próprio temor dentro da própria alma." (Fernando Pessoa);…

Quanta sabedoria contra as teorias do medo?! Porém, ele está aí.

Entrando numa quase-contradição, dá a ideia que isto que estamos a ver passar nos nossos olhos são medos da asneira feita e do que devia ser feito: apoios interesseiros ao lado errado da “barricada” (grupos rebeldes da Síria, do Iraque,…); esgotar o tempo para tirar o máximo proveito dos interesses instalados; não querer ajudar a resolver o problema no seu próprio local – lá onde as pessoas foram desenraizadas, onde há petróleo, onde também corre (algum) leite e mel!

É certo que, como acontece em todas as famílias e grupos mais restritos de amigos que viajam em ambiente normal (conforto, bens, destino,… assegurados), no meio do trigo haverá sempre algum joio!

“Não tenhais medo” (S. João Paulo II).

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Big Brother

 
Em 2008, Stephan Coleman escreveu um artigo ( “How democracies have disengaged from young people” – como as democracias se têm desligado dos jovens) com base num estudo de caráter sociológico.
O autor defende que, ao contrário do que é comummente assumido pelos críticos, não serão os jovens a não se interessarem e a envolverem na política mas a própria política que se apresenta como uma realidade à parte do seu mundo, da sua experiência, com linguagem diferente e em exclusividade demográfica, grupos privilegiados, herméticos, predefinidos.
As prerrogativas para o estudo realizado advieram dos resultados apresentados pela Comissão Eleitoral inglesa, sobre o funcionamento do país, que indicava a disponibilidade da participação dos jovens em questões relacionadas com a vida do país, ficando, no entanto, esta vontade, na maior parte das vezes, pelo campo das intenções, uma vez que o sentimento comum é o de que existe um divórcio entre os políticos e o público jovem em geral, o que comprova os resultados do referido estudo quando refere que 90% dos jovens afirmam não terem envolvimento na política.
Ao focar-se na interação que os jovens mantêm com o programa Big Brother, Stephan Coleman, entre outros autores da mesma área cientifica, apuraram que os votantes nas eleições gerais de 2005, assim como os espetadores do referido programa, eram predominantemente jovens e do sexo feminino. Este sucesso interativo produzido nos jovens, pelo Big Brother, levanta perguntas sobre a possibilidade da política alargar o seu âmbito incorporando assuntos associados à cultura “popular” – diríamos, na moda. Este entusiasmo participativo dos jovens na interação com o programa, algo que a maioria dos políticos gostaria de provocar nos eleitores, não deveria ser mal visto, mas antes rentabilizado para uma possível convergência de estilos populares e políticas de comunicação que revigorassem a forma da participação dos jovens na política e vice-versa – é criticável, logo se vê!
As diferenças nas abordagens dos políticos, que procuram mandatos populares, e dos participantes no programa, em captar audiência e votos, são importantes, não por demonstrarem a sua natureza distinta e incomparável, mas pela forma como é estimulada a participação e o alcance obtido.
Este estudo incidiu numa amostra de 200 pessoas com mais de 18 anos, que reuniam características como serem telespetadores do Big Brother e cidadãos ativos. A realidade social tornou-se cada vez mais uma questão de experiência mediada, podendo-se argumentar que os públicos e as audiências são as mesmas pessoas que passam pelo mesmo processo de tentar dar sentido a um mundo que só pode ser apreendido de forma indireta.
A vida privada passa a ter uma influência na determinação do bem público, e é aí, na esfera pública, que os públicos convergem para se tornarem cidadãos ativos, indiferentes e livres para desligar, mudar de canal, interagir com outros conteúdos que mais lhes interessem ou que funcionem, que provoquem efeito sobre si mesmos.
Nos quinze anos da primeira edição do programa em Portugal, depois do “show” na Rua Abade Faria, em plena pre-campanha para as eleições legislativas, diríamos… finalmente, estamos no bom caminho. Ou como o rapaz da pizza pode mudar o mundo!
(Correio do Vouga, 2015.09.09)








terça-feira, 1 de setembro de 2015

“The fireman”, Bombeiros e bombos

 

É de elementar justiça sublinhar, enaltecer repetidamente a importância dos primeiros – na realidade, em termos práticos exercem a mesma função, quanto à definição, e são mais do que a definição possa sugerir (assistência no acidente, socorro em quase toda a linha de atuação, quer humana quer outra: no animal que é preciso recuperar do perigo, a limpeza da sargeta que provoca a inundação, a árvore que cai derrubada pela intempérie,…). São, como é usual denominar-se, elementos da proteção civil – seja lá o que isso for! São é a proteção a tudo (civil ou não!).

Em inglês, bombeiro é chamado o "homem do fogo", “fireman”, o profissional que elimina o fogo; na língua portuguesa, a palavra "bombeiro" deriva de "bomba", máquina que eleva, pressiona, faz fluir normalmente a água numa determinada direção. Contudo, para não permitir a confusão, também temos em português “bombo”, do grego “bómbos”, o que faz "barulho", “ruído grave, forte”, em particular o "ribombar do trovão".

Mas este interesse sobre a curiosidade dos termos (“fireman”, bombeiro, bombo) apenas ajuda a perceber o que vai acontecendo e que importa fazer notar, destacar, com uma certa dose de conotação bombástica, para suscitar a leitura e interpretações mais atentas a todos e a cada um (participante desta “tribo” de humanos).

A Europa: “The fireman”.

Está a “mexer”, e sucessivamente, com o fogo em vários assuntos. O desmembramento parece iminente!. Claro que a crise dos migrantes, com os últimos acontecimentos tão vertiginosos, faz esquecer o que se passa por aí… em Calais (França), no autoproclamado Estado Islâmico, na Indonésia (Malaca e Aceh), Birmânia, no centro de África,…

O próximo Governo: o “bombeiro” (para tantos “incêndios”, que teimam em lavrar há mais de cento e cinquenta anos)!

Os governos têm o seu “quid” com esta conotação (de bombeiro). Aliás, dizia há dias um responsável político, há determinados governantes que por não acreditarem ideologicamente ser possível gerir bem o que é “público”, quando eleitos para isso, fazem-no sempre mal! Deixamos duas indicações recentes: o Estatuto dos militares da GNR, adiado; o pagamento de 54 mil milhões de euros a quem comprou obrigações do Tesouro e à “troika”,… e muito mais que sucede cada dia!

Os funcionários(?) da Câmara de Aveiro: o “bombo” (quem suporta as culpas).

Há coisas (as desagradáveis são sempre) que têm de ser apuradas junto de terceiros! Diz o Diário de Aveiro (jornal do dia 31 de agosto) que sacos com raticida, animais mortos, tal como aves, além de ratos, um cão e gatos têm sido encontrados pela cidade, alarmando principalmente os donos de cães que passeiam os seus animais pelo centro de Aveiro e receiam que possam ser envenenados. O envenenamento de outros animais para além de ratos é um receio que tem crescido nas últimas semanas devido à descoberta da colocação de sacos com raticida em locais de circulação de animais de companhia e pessoas.

O Diário de Aveiro não conseguiu saber quem anda a colocar esses sacos pela cidade, o que está a acontecer, pelo menos desde Junho último. O presidente da Câmara de Aveiro, Ribau Esteves, desconhece qualquer procedimento deste tipo pelos serviços da autarquia, ressalvando que a eliminação de roedores é feita nos edifícios municipais e não em zonas do exterior. De qualquer forma, o autarca disse ao Diário de Aveiro que, hoje, iria “averiguar” – coitado do bombo! - o que está a acontecer. Junto à antiga Capitania, já foi visto a colocação de sacos por indivíduos com colete e farda de cor verde. Contudo, nenhuma empresa conhecida tem, na lista de actuação, a colocação de sacos de raticida pela cidade.”

O “bombo” que vier atrás… vai apagar o fogo!

(in Correio do Vouga, 2015.09.02)

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

O regresso

 
E tantos regressos de que podemos falar…!
Desde logo o recomeço depois de férias. Se abordámos a despedida (Até já) também queremos assinalar este reinício que, como desejamos em todos os regressos, seja marcado pela vontade de assumir com determinação tudo o que foi interrompido, para concretizar o sonhado.
Este regresso também bebe inspiração em Fernando Pessoa: “Outrora eu era daqui, e hoje regresso estrangeiro,/ Forasteiro do que vejo e ouço, velho de mim. /Já vi tudo, ainda o que nunca vi, nem o que nunca verei./Eu reinei no que nunca fui.”
Cá estamos a regressar!
E tal como a partida é de esperança no regresso, o regresso é de redobrada esperança no futuro, porém…
O mundo, o mais próximo, próximo mesmo, e o de mais longe parece também voltar ao início, a um regresso pesado e pesaroso, porque dá ideia da memória curta que o ser humano estabelece por predefinição: Aveiro sem alma em tempo de verão – até algumas parangonas (só isso) sonantes para este tempo não passaram de “bluff” (passe o inglesismo); Portugal à beira das eleições e há correntes no espaço público que tendem a defender o caos suscitando para a política como que um bando de malfeitores, como um mapa tenebroso pejorativo da democracia (da Grécia, a clássica, claro!): sofistas (que ensinavam a arte de bem falar), a retórica (a arte de convencer os outros pelo discurso) e a demagogia (quem conduz o povo menos afortunado); cinismo (viver na virtude de acordo com a natureza) e hipocrisia (representação)! E, claro, temperado, neste tempo, com “só corruptos”! A política é a casa comum administrada pelo poder representativo, em nome das pessoas, que têm a melhor oportunidade de exercerem o poder nos momentos de decisão eleitoral! Confundir é interesse de quem quer deturpar por artimanhas.
E há outros regressos…
Rotinas, desde logo!
E, preocupante, insistentemente preocupante, o movimento de desalojados na Europa – o maior desde a Segunda Grande Guerra!? Pessoas sem nada que nada têm a perder!?
Tem razão o Papa Francisco (a Terceira Guerra Mundial já começou)?!
As fortalezas, aquelas que parecem inexpugnáveis, também caem! Não dá para ver?
Provavelmente, a maior força da destruição da Europa é aquela que não se vê.
Que o reinício não seja regresso ao passado!
(Correio do Vouga, 2015.08.26)













segunda-feira, 27 de julho de 2015

Até já




Sim, até já?!
Porque há tanto para fazer, tanto para refletir, tanto sonho por cumprir, que só assoma dizer-se “até já”!
Muitas vezes (até já!) não passa de um eufemismo: queremos que a despedida, vislumbrada como definitiva, não o seja; quer-se apenas mais doce.
Na intenção será, porventura, uma forma de expressar que se deseja voltar em breve. E, às vezes, o “até já” definitivo é apenas, como nos inspiram três poemas – motivados pelo regresso às férias!? – imperativo para reparar um momento, um percurso menos cuidado, um desvio que conduz ao reencontro mais à frente.
Por muito que se deseje ou não deseje, em cada etapa que termina haverá sempre “até já”, porque não somos donos do tempo nem o tempo resolve o que compete ao engenho: Dizem que o tempo ameniza/ Isto é faltar com a verdade/ Dor real se fortalece/ Como os músculos, com a idade. É um teste no sofrimento/Mas não o debelaria/ Se o tempo fosse remédio/Nenhum mal existiria (atribuído à norte-americana Emilly Elizabeth Dickinson).
Este é o tempo de estio, o verão, que tem destas coisas: chegadas e partidas.!
Quando gostamos muito de algo ou de alguma coisa, espera-se muito pela chegada… e é dolorosa a partida! Porém, também há partidas feitas de forma inesperada que aguardam um regresso ambicionado. No dizer poético de Fernando Pessoa, através da metáfora do rio, é algo “entre o sono e o sonho”:
Entre o sono e o sonho,
Entre mim e o que em mim me suponho,
Corre um rio sem fim.

Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.

Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.

E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre -
Esse rio sem fim.

Passa-se por outras margens… muda-se! E, no final, o rio (que é a vida) continua o seu curso!
Transforme-se, altere-se, modifique-se, sim mude-se tudo e nada, porque todo o mundo é composto de mudança (Camões)… E na outra margem, depois de tanta mudança, não é raro lançar o olhar e reverem-se as qualidades das quais se partiu!

[Ao sairmos (Correio do Vouga) por uns dias… até já!]

terça-feira, 14 de julho de 2015

Acordo




Até no que parece impossível há sempre esperança! Do final - feliz ou não - saliente-se o mais importante no tempo que vivemos: ACORDO, estar junto do coração?!
Não vale a pena ficarmos juntos a qualquer preço mas vale a pena tentar evitar o ostracismo e as exclusões!
Para quem aprecia ir à origem das coisas, ao étimo (do grego “étymon”, «verdadeiro; certo») “acordo” vem do Latim “accordare”, uma variante de “concordare”, “estar em harmonia, concordar”, de “com”(junto) mais “cor” (coração).
Acordo!?
Quem espera sempre alcança! – diz-se. Pois, se já o foi assim, que assim o seja também. Um momento é um momento e estar junto do coração leva a superar muitos momentos, os mais inebriantes, os mais longos, os mais difíceis,… todos os momentos.
Que, no final, vença um bom acordo!
Falamos da União Europeia mas podemos inspirar-nos em todas as uniões! Afinal até o Eurogrupo (segundo o ex-ministro das finanças Varoufakis) é uma união sem existência… legal, claro!
Varoufakis, numa entrevista recente, até explica o momento da sua “expulsão” (da reunião do Eurogrupo em junho). Quando chamou a atenção de Dijsselbloem que as declarações do Eurogrupo têm de ser aprovadas por unanimidade e que ele não pode convocar uma reunião excluindo um dos membros, “ele disse: Tenho a certeza de que posso. Então pedi um parecer legal. Isso criou alguma confusão. A reunião parou cinco ou dez minutos, os funcionários falavam uns com os outros ao telefone e acabou por chegar um responsável dos assuntos legais ao pé de mim a dizer-me isto: Bom, o Eurogrupo não tem existência legal, não há nenhum tratado que tenha previsto este grupo”.
“Eurogrupo toma decisões quase de vida ou morte e nenhum membro tem de prestar contas a ninguém”
“Afinal o que temos é um grupo inexistente que tem o maior poder para determinar as vidas dos europeus. Não presta contas a ninguém, dado que não existe na lei; não há minutas das reuniões; e é confidencial. Por isso nenhum cidadão sabe o que lá é dito… São decisões quase de vida ou morte e nenhum membro tem de prestar contas a ninguém”, prosseguiu Varoufakis.
E mesmo assim, a Grécia conseguiu um acordo. É bom? Será mau? É o acordo possível, dir-se-á!
O que nos interessa realmente sublinhar é a possibilidade de ver mais longe, mesmo num momento difícil!